sábado, 3 de abril de 2010

Cia. do Latão faz "experiência pedagógica" com público em ensaio aberto

Por GUSTAVO FIORATTI
da Folha de S.Paulo

A cena que estava em curso no palco do Sesc Santana mostrava uma viúva aflita, sem ter onde enterrar o marido morto. Um acordeão acompanhava com melodia triste, até que o diretor do grupo Latão, Sérgio de Carvalho, interrompeu. "Joga mais luz aqui, por favor, quero menos clima, ok?" Os atores congelaram por um momento, esperaram a mudança na iluminação, depois deram continuidade ao espetáculo inacabado, que a companhia deve estrear apenas em agosto.
A cena que estava em curso no palco do Sesc Santana mostrava uma viúva aflita, sem ter onde enterrar o marido morto. Um acordeão acompanhava com melodia triste, até que o diretor do grupo Latão, Sérgio de Carvalho, interrompeu. "Joga mais luz aqui, por favor, quero menos clima, ok?" Os atores congelaram por um momento, esperaram a mudança na iluminação, depois deram continuidade ao espetáculo inacabado, que a companhia deve estrear apenas em agosto.
É a primeira vez que o Latão experimenta um modelo já usado, por exemplo, por Zé Celso no Oficina. "Ópera dos Vivos" é o nome que a montagem, dividida em quatro pequenos espetáculos articulados, deve ganhar quando pronta.
Inclusive o texto da peça está apenas rascunhado, com base em uma pesquisa sobre a produção artística dos anos 60.

Imagem: Zanone Fraissat/Folha Imagem
Atores da Cia. do Latão em uma passagem de cena no ensaio do novo espetáculo do grupo, "Ópera dos Vivos"

Quatro histórias

Quatro momentos são reconhecidos pelo trabalho: os anos que antecedem o golpe de 1964, a produção artística que prossegue até 68, o retrocesso provocado pelo AI-5 e os anos que se estendem década de 1970 adentro, com o fortalecimento da indústria cultural.
O tema do endurecimento do regime aparece também sob uma perspectiva econômica, tendo ao fundo um aquecimento global em contraposição à paralisia provocada pelos atos institucionais e pela censura.
"Houve um corte histórico violento na produção artística. Muita gente morreu, muita gente foi exilada, muita gente foi levada para a clandestinidade, e alguns sobreviventes acabaram incorporados pela indústria cultural. Não é a toa que a geração de esquerda dos dramaturgos do Teatro de Arena foram trabalhar na Rede Globo", diz Carvalho.
A pesquisa traz traços de obras produzidas à época. É possível reconhecer uma espécie de sombra dos filmes de Glauber Rocha, do musical "Roda Viva", de Chico Buarque, e de peças de Oduvaldo Vianna Filho. Tudo redesenhado para evitar a iminência de um anacronismo ideológico e estético.
A polarização política que marcou a década pode ter dado base a "muita coisa ruim", inclusive nos anos posteriores que tentaram retratar o período, diz Carvalho, mas para ele aquela inquietação foi fértil e determinou caminhos futuros.
Uma de suas motivações para escrever "Ópera dos Vivos" foi um depoimento recente de Ferreira Gullar desqualificando sua própria experiência artística no pré-64, "como se ela tivesse sido ingênua politicamente e ruim esteticamente", diz Carvalho. "Como se a inquietação política que alimentava aquela obra antes fosse um limite, que a prendia a uma má qualidade estética. Isso é mentira", protesta o diretor.

ÓPERA DOS VIVOS: ABERTURA DE PROCESSO
Quando: Hoje e amanhã, às 20h; de 7 a 11 de abril, das 15h às 22h
Onde: Sesc Santana
(Av. Luiz Dumont Villares, 579, tel. 2971-8700)
Quanto: Grátis (12 anos)

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u715675.shtml

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